Por Suélen Ramos
A Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC) encerra hoje a série de entrevistas sobre o julgamento da Ação Penal 470 – o "Mensalão" – pelo Supremo Tribunal Federal (STF), com a análise crítica de magistrados do Poder Judiciário de Santa Catarina, sobre o tema. Na sexta e última entrevista da série, a Juíza aposentada Maria Terezinha Mendonça de Oliveira opina sobre o andamento do julgamento iniciado em 2 de agosto e que, até o momento, condenou o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu, o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, o ex-presidente do PT, José Genoino, o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, o Deputado Federal do PT, João Paulo Cunha, a ex-presidente do Banco Rural, Kátia Rabello e o ex-tesoureiro do PL Jacinto Lamas, entre outros.
A Juíza aposentada reconhece que o Poder Judiciário está firme e que a melhor maneira de proceder em um julgamento do porte do “Mensalão” é votar de maneira coerente. Maria Terezinha Mendonça ressalta também que o processo de indicação dos Ministros ao STF deveria ser mudado, para que fosse mais democrático.
“O relator sempre é mais firme, porque ele quer levar todo mundo para o lado dele”
1. A senhora acredita que a opinião pública nesse momento sobre o Supremo Tribunal Federal (STF) pode atrapalhar ou até mesmo influenciar no julgamento do mensalão?
Não influencia. Os Ministros estão com a “cabeça feita” com tudo o que eles têm nos autos. Não é a opinião pública que vai fazer. Nós não temos que temer a opinião pública, nós temos que julgar. O que está nos autos é o que é; então eu tenho que julgar por aquilo que eu tenho em mãos. Tenho provas aqui e sei que essa prova é escorreita. Pronto e acabou.
2. Em sua opinião, o julgamento tem sido rigorosamente técnico e não político?
Eu não vejo influência política no julgamento. Fala-se por ai, dizem muita coisa. Está rigorosamente técnico e espero que continue. Eu acredito que quando a gente chega a Ministro está com uma “cabeça muito feita”. Tem que estar muito consciente de si, pelo tempo que tem de carreira. Os Ministros não serão influenciados por Dilma ou PT.
3. E sobre a formação do STF, cuja indicação dos Ministros é feita pelo Presidente da República em exercício. Isto deveria mudar?
O método poderia ser mudado, por meio do voto dos Ministros do Supremo para a escolha. Seria mais salutar, já que não seria um só decidindo. Porque sempre alguém vai dizer: “Ah, mas é amigo do Presidente, por isso se tornou Ministro”. E se não for amigo do Presidente ou conhecido da família, então não pode ser Ministro. Acho que com a forma atual de escolha o Presidente da República acaba influenciando dentro do Poder Judiciário, porque ele coloca no Supremo quem ele (ela) quer. Por isso sou contra. Você “dá um duro danado”, estuda pra “caramba”, vai competir com um e outro para subir na vida e não consegue chegar a Ministro. Não digo isso pela questão de o Ministro se deixar influenciar pelo Presidente, mas por não dar chance aos outros que poderiam chegar à posição no STF. Seria muito mais salutar se todo mundo tivesse a chance.
4. O julgamento do “Mensalão” melhora ou piora a imagem do Poder Judiciário perante a sociedade?
Segundo as pessoas estão comentando, o Poder Judiciário ainda está firme. Eu vejo isso quando converso com um e outro. O que eu acho do Mensalão? Uma vergonha para o povo brasileiro. A imagem do Judiciário está positiva. Se os Ministros continuarem na linha que estão seguindo os “peixes grandes” serão condenados.
5. O que a senhora acha da exposição do Poder Judiciário nesse momento, levando em conta as divergências entre os Ministros, no julgamento da AP 470, principalmente entre o relator e o revisor do processo, os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski?
Isso não é bom, mas como é próprio do ser humano, nenhuma mente é igual à outra e a divergência, muitas vezes, é uma coisa boa. A divergência muda opiniões. A gente espera somente coerência. Se eles forem coerentes, palmas para eles, porque é só isso que eu peço: coerência. Nada de passar a mão na cabeça. Colocou coerência na frente, tudo sai certo. E a divergência até desafia os Ministros a prestarem mais atenção no que estão fazendo, porque se “pisar na bola” o outro estará atento. O relator sempre é mais firme, porque ele quer levar todo mundo para o lado dele. Eu interpreto assim: você não pode pensar igual a mim. Você lê uma frase, você tem uma interpretação às vezes oposta à minha, por isso o ditado: “cada cabeça uma sentença”. Ninguém vê a coisa igual. Você lê, eu leio a mesma coisa, mas pra mim é uma coisa, pra você é outra. Eu vou interpretar de uma forma, você de outra. É saudável essa divergência porque com ela aprendemos muito.
6. A senhora acredita que a justiça deveria criar mais varas ou redobrar a atenção de crimes contra a administração pública, para que não se chegasse a um julgamento do porte do “Mensalão”?
Acho que sim. Nós temos pouca estrutura nas comarcas e fóruns. No dia em que criarem mais varas, terão que trazer mais profissionais e isso será bom. Os concursos aprovariam mais pessoas. A Justiça não é lenta. O que é lento é o caminho. Não temos como acelerar o trâmite processual.
7. A senhora acha que o julgamento do “Mensalão” vai influenciar no trabalho dos magistrados no país, daqui em diante?
Acho que não. Cada um já tem seu modelo de ser; seus pensamentos. Eu não vou mudar o meu. Mensalão pra mim é um processo como qualquer outro. É uma vergonha sim, mas a minha postura não vai mudar diante do Mensalão. Vou ser eu mesma, julgadora do mesmo jeito. É um julgamento como qualquer outro.