Juiz Ingo Sarlet e professor Joaquim Falcão debatem sobre o relevante papel da Justiça em momentos de crise

O terceiro painel do Congresso Estadual de Magistrados 2012 levou à mesa de discussões um assunto amplo e atual: “A Justiça e a Sociedade – o tema e seus desafios”. Com a participação do juiz Ingo Sarlet, da Justiça Gaúcha, e do ex-Conselheiro Nacional de Justiça e diretor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), professor Joaquim Falcão, os debates tiveram a mediação pelo desembargador Luiz Cézar Medeiros, presidente do Tribunal Regional Eleitoral/SC.

Após as boas-vindas do mediador, o juiz Sarlet começou os trabalhos com uma análise das ferramentas da atual magistratura, em referência a critérios técnicos e éticos das atividades judicantes. Um dos pontos ressaltados por ele foi a ética dos magistrados. “A tendência das posições do STF mostra que o código de ética da magistratura pode ser muito bem explorado por nós. Em relação a isso, algo interessante a ser melhor observado é o dever de prudência, que muitas vezes não temos, já que nem sempre o aplicamos bem, por vários fatores, como tempo e o reduzido número de pessoal”, disse. 

O juiz gaúcho, especialista em Direito Constitucional e Teoria dos Direitos Fundamentais, destacou também os atos dos juízes na tomada de decisões, principalmente no tocante à independência dos magistrados. “O dever de humildade de juiz, no contexto da independência funcional e ética, é muito difícil de ser executado. Mas é de grande importância, principalmente, na questão da fundamentação e criação de teses. Já que a sociedade observa essas decisões”, explicou.

No final de sua fala, o magistrado deixou um espaço para comentar o julgamento de ações de forma “mecânica”. Segundo Ingo, atualmente, esta é uma prática muito comum por parte dos operadores do Direito e que precisa ser revista, justamente para se evitar sentenças equivocadas. “Hoje ocorrem muitas argumentações baseadas em ementas de decisões anteriores. Passei por uma situação como essas, recentemente. Fui conferir o acórdão da ementa e vi que era um caso totalmente distinto. Isso mostra o quanto estão carimbadas as sentenças”, explanou.

Antes de encerrar, ele ainda trouxe à tona as críticas recebidas pela magistratura, principalmente por grupos políticos, em razão das recentes condenações de agentes públicos. “Nós juízes estamos julgando incessantemente, o que fortalece a nossa imagem, mas também ficamos visíveis a críticas. Um exemplo é o que li num jornal, dia desses. Um artigo dizia que os principais inimigos dos políticos, atualmente, são o Ministério Publico e a Justiça. O motivo: as condenações por improbidade administrativa”, refletiu.

O desembargador Luiz Cézar Medeiros, antes de passar o microfone ao professor Falcão, aproveitou para somar sua opinião às palavras de Sarlet. “Deveríamos dar uma atenção maior aos casos de repercussão, em que as decisões contrariam as expectativas da sociedade, principalmente por influência da mídia. Precisamos melhor fundamentar juridicamente ou ao menos esclarecer os detalhes aos cidadãos”, acrescentou.

Em seguida foi a vez do ex-Conselheiro Nacional de Justiça, professor Joaquim Falcão, tomar a palavra. De modo sereno, ele abordou o julgamento da ação 470 – o Caso do Mensalão –, a importância dos tribunais constitucionais em momentos de crises e a revolução da tecnologia em favor da aproximação da Justiça com a sociedade.

De início, o professor falou da atual evidência do Supremo Tribunal Federal. Um dos motivos de tal exposição, segundo ele, é justamente o fato de as condenações recentes terem agradado a opinião pública. “O STF é um ator político muito importante para sociedade. Mas o que fez com que a Corte tivesse todo esse índice positivo de popularidade? É algo que só ocorreu agora, com o mensalão? Não, nós temos aplausos quando decidimos com as expectativas da sociedade e da mídia”, disse, ao fazer referência à relevância das discussões e debates entre os julgadores, nesses casos.

Falcão ainda utilizou o exemplo de outros países para sustentar o importante papel dos tribunais superiores em épocas de crise. “O protagonismo das Cortes Supremas é sempre evidenciado durante abalos constitucionais. E isso não é só aqui. Um voto do Supremo americano, por exemplo, foi suficiente para mudar a história do mundo, ao decidir a vitória de George Bush contra o Al Gore, em 2000”, lembrou.

Outro caso explanado pelo professor, doutor em Educação pela University of Génève, foi a intervenção do governo da Alemanha ao tentar ajudar os países europeus, atingidos pela crise do Euro. A chanceler Angela Merkel, de acordo com a decisão dos magistrados alemães, não poderia ter realizado empréstimos sem o aval do parlamento. No entanto, houve a permissão dos já efetuados, se estabelecendo a restrição dos próximos.

“Primeiro o Tribunal tranquilizou o povo, dizendo que este tem o poder sobre o dinheiro. E ao mesmo tempo, disse aos credores para não pressionarem a chanceler para mais empréstimos. Isso mostra mais uma vez uma vez que o Judiciário está se movendo para salvar o Euro”, destacou Falcão.

No final, o diretor de Direito da FGV ainda enfatizou o papel das redes sociais e da imprensa quando ao exercício de cidadania, ao transmitir julgamentos do Supremo Tribunal Federal, algo que só existe no Brasil e no México. Para ele, toda essa mobilização vivida nos últimos quatro meses é um marco para o Judiciário brasileiro.

“Acho que o Brasil e o mundo vivem um momento inédito. A TV Justiça, com a cobertura do mensalão, fez que com que as pessoas pudessem acompanhar os bastidores do Judiciário. Agora todo mundo tem acesso à Constituição diretamente pelas mídias”, ressaltou ao lembrar que essa revolução só está começando. “As emissoras institucionais tendem muito a crescer, porque vivemos a liberdade de expressão plena e o desenvolvimento das tecnologias e das mídias sociais. E terão manifestações maiores, futuramente, no âmbito dos tribunais estaduais. Essa é a tendência”.

Por Eduardo Nascimento

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *