Como foi o trabalho realizado por vocês em Brasília?
Nós fomos a quase todos os gabinetes e distribuímos um memorial que objetiva demonstrar ao Conselho Nacional de Justiça tanto para decisão do nosso caso, que envolve a indagação sobre o pagamento do auxílio-moradia aos juízes de Santa Catarina, quanto para uma eventual regulação futura na matéria para todos os juízes do Brasil. Nós procuramos demonstrar que qualquer regulação desta natureza não pode estar restrita somente à idéia de pagamento de aluguel só para o magistrado que paga aluguel, como nós procuramos salientar, mas que deve preencher outros conteúdos econômicos. O juiz – permita-me uma metáfora interessante – assim como uma tartaruga, que carrega a casa nas costas, o juiz carrega com ele o gabinete judicial nas costas. O juiz trabalha 24 horas. O juiz é atendido em casa, o juiz é assediado em sua casa para atender. O juiz usa o telefone, o juiz usa a energia elétrica, usa os utensílios domésticos para cumprir a sua função. O juiz usa a sua cama para estudar os processos, o juiz tem uma dedicação tão grande que o uso da sua moradia é uma extensão do seu gabinete judicial. A preocupação com esse trabalho é demonstrar em primeiro plano que não é só pagável ao juiz que paga aluguel. É pagável ao juiz que tem residência própria ou que quer adquirir residência a própria, ou que está financiando a residência própria. Isso é também uma opinião respaldada pelo ministro Marco Aurélio, do STF, no mandado de segurança, que começou o julgamento em setembro do ano passado, que não finalizou o julgamento no STF, mas tento em conta a lei nº 8.112 que regula o estatuto dos servidores públicos federais e tendo uma portaria do próprio CNJ que regulou o auxílio-moradia para os conselheiros, nós vemos que talvez que o conselho queira se inclinar pela idéia de pagamento de aluguel, na medida do aluguel e com a comprovação do valor do aluguel. Se for assim aprovado na medida regulatória, se for a decisão do caso de SC vai gerar uma redução não só do valor do auxílio-moradia para nossa magistratura catarinense como reduzirá o universo de juízes beneficiados, de magistrados beneficiados. Então, é uma situação que entendemos a um tempo ilegal e a um tempo inconstitucional, porque há leis em SC regulando o direito de auxílio-moradia. Esta é uma matéria que entendemos é própria da competência legislativa do estado membro. E morar não é só pagar aluguel. Morar tem condomínio, tem energia elétrica, tem a própria proximidade da casa do magistrado da escola dos seus filhos, da proximidade do fórum, tudo isso tem um custo financeiro que cada estado da federação tem que produzir o seu, a sua ajuda de custo. Uma coisa é um juiz no Maranhão, outra coisa é um juiz no Amapá. Outra coisa é o juiz que mora na região amazônica que precisa às vezes transportar-se de barco ou de avião para exercer a jurisdição. Outra coisa, o juiz em SC, a sua realidade sócio-econômica. Então, a nossa interferência no processo é tanto para mostrar que SC tem lei anterior, regulando a situação, inclusive com elogios de alguns conselheiros ao valor fixado em Santa Catarina, de até 10%, entendendo ser razoável. No caso do mandado de segurança que está no Supremo, o ministro Marco Aurélio acredita que até 20% do subsídio seria razoável. Em SC é 10%. Nós temos a debater é que não pode ser só para o pagamento de aluguel, tem que abranger outros conteúdos econômicos.
Quais foram os conselheiros que vocês visitaram?
Nós visitamos praticamente todos os conselheiros, fora o conselheiro Gilson Dipp e o conselheiro Ives Gandra Filho. Nós encontramos com os conselheiros Luiz Felipe Locke, Calou, Marcelo Neves, Jorge Hélio, Milton Nobre, que é o relator do processo, e nos atendeu muito bem. Ele queria julgar e pedimos o adiamento, mostrando razões para as quais ele acabou aceitando no fim do dia, entendendo que ele precisaria amadurecer mesmo. Depois de ter lido o memorial de madrugada, como nos relatou, memorial que a AMC apresentou através do trabalho dos nossos advogados, ele viu que precisa de uma maior reflexão e decidiu adiar esse julgamento para uma próxima sessão que pode ser daqui a 15 dias ou 30 dias. Nós estaremos monitorando com o relator do CNJ para sabermos esse momento.
Como eles receberam esses argumentos?
O relator nos disse que a entrega do memorial fez ele refletir e emendar, não sabemos em que extensão. Disse-nos ele que o nosso memorial o fez acordar muito cedo, às 4h da manhã de terça-feira, para poder incorporar reflexões críticas do que fizemos. Como é um projeto de resolução, nós entendemos que é possível, assim com um projeto de lei que tramita na Assembléia Legislativa ou no Conselho Nacional, podemos ter acesso ao processo. Vamos fazer uma solicitação por escrito para que ele antecipe o texto da resolução. É um projeto de regulação que interessa todo seu país, toda a magistratura brasileira como nós sabemos. Mas, a princípio, vamos argumentar que a lei 8.112, que regula a percepção de um auxílio moradia por servidor público, por agente administrativo, por figuras honrosas que tenham um expediente pré-marcado, não é um bom parâmetro. Outra questão é que não cabe ao CNJ fazer a regulação desta forma, ou seja, dizer que só pode para pagamento de aluguel, excluindo o juiz que tem residência própria, ou que queira adquirir residência própria, ou que seja só para paga de aluguel e no montante do aluguel. Entendemos que se o CNJ assim agir estará violando a Loman, porque ela não distingui o juiz que paga aluguel do que tem residência própria. A Loman distingui entre juízes que não têm residência oficial e juízes que têm residência oficial. Outro ponto é que em 1979 vigorava a Constituição de 69, uma Constituição autoritária de regime limitar. Nós temos uma constituição que respeita os princípios federativos, a autonomia do Estado. Uma Constituição que em termos normativos, termos reflexivos, ela é muito mais rica no seu princípio federativo, no seu princípio democrático. Entendo com todo respeito que se o CNJ excluir essa matéria será um retrocesso em relação à própria Loman, a atual Constituição e violará artigos da Constituição do Estado de SC. Então, se o resultado para o nosso caso concreto for uma ordem de que somente poderá receber o benefício o juiz que paga o aluguel, e no valor do aluguel, nós questionaremos perante o STF, via mandado de segurança coletivo ou outra ação civil coletiva para evitar que essa repercussão seja negativa na esfera de direitos dos juízes catarinenses. Será possível, ainda, se questionar, através de uma ação direta de inconstitucionalidade junto ao STF, movida no caso pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB). Mas, os magistrados precisam saber que alguma redução advirá, alguma situação nova se inaugurará e manter como está não será possível.
É possível prever como vai ficar?
Vamos verificar o regimento. A portaria 251, de 19 de maio de 2008, no seu artigo III, portaria do CNJ, nós verificaremos que há uma preocupação com a paga de aluguel e seu efetivo ressarcimento do montante do aluguel. E, ainda, o conselheiro Milton Nobre, na conversa que tivemos com ele, disse que talvez um dos sistemas orientantes dessa nova regulação seria a lei 8.112, que é uma lei que, inclusive, foi criticada no STF, pelo Ministro Marco Aurélio nesse mandado de segurança do Mato Grosso. Diz o ministro, com muito acerto, que a lei nº 8.112, não poderia ser trazida analogicamente para justificar ou para impedir o auxílio-moradia como no montante em que era pago no Mato Grosso. Há uma tendência de ver auxílio-moradia como uma paga de aluguel. E isso no nosso entendimento, da AMC, e do ministro Marco Aurélio do STF, veja que estamos bem acompanhados, que essa não seria a posição correta.
Os magistrados correm o risco de ter que devolver o que já lhes foi pago?
Há uma jurisprudência corrente no STF que diz que vencimentos, assim como subsídios, recebidos de boa fé não são devolvidos. Como nós temos normas que regravam o assunto, temos lei estadual para o caso de SC, eu não creio que isso ocorrerá e também não se levanta isso no processo de controle. Não podemos antever o que dirá o conselheiro Milton Nobre, mas não há essa colocação e se algum conselheiro aventar esta hipótese vai esbarrar na segurança jurídica, na boa fé, pois não era pago ilegalmente. O maior problema, creio, são fatores de redução da percepção do valor e alguns magistrados talvez percam a possibilidade de receber este auxílio moradia, mas isto são situações que nós teremos que aguardar o julgamento para verificar, porque SC tem uma situação peculiar, de moderação. Há tribunais que chegaram a fixar de 30% a 35%, o que gerou uma sensação de certo abuso entre os conselheiros do CNJ. Mas SC fixou em 10%. Precisamos aguardar. Tanto o Dr. Sérgio Junkes que esteve conosco em Brasília, quanto o Dr. Paulo Bruschi, estão bastante atentos e empenhados nesta questão.
Qual a expectativa com a posse do ministro Cezar Peluso na presidência do STF e do CNJ?
Há uma vantagem da experiência, da idade. O ministro Cezar Peluso é um magistrado de carreira. Talvez a entrada do ministro possa trazer toda uma sensibilidade ao caso para o Conselho. No CNJ, poucos são os juízes de direito que lá estão.
Algo mais a acrescentar?
Acrescentar que estivemos durante a sessão do Conselho e vimos que a atuação da AMC, contratar advogados especialistas para tratar a causa, foi muito bem vista e elogiada. A função de um advogado numa situação dessas é muito importante. Nem todas as associações acabam indo lá com advogados especializados e isso não é simples. As estratégias nem sempre cabem a um magistrado, que por mais estudioso que seja, não está munido de respaldo da atividade postulatória da advocacia para agir nesta situação. Percebi na postura do Dr. Sérgio Junkes e na postura da atual diretoria da AMC, que eles estão dispostos a essa briga, a enfrentar a defesa nos tribunais, das conquistas democráticas legais e legítimas da magistratura catarinense, fruto da autonomia do legislativo de SC.