Artigo – “A magistratura e sua vital importância ao exercício da cidadania”

A arte e o ofício de julgar, sem sombra de dúvidas, reclama de seu protagonista – o julgador –  uma série de características especiais e sem as quais os membros da sociedade,  que aguardam uma apreciação de suas demandas, estariam, fatalmente,  postos a elevado e incalculável risco na análise de seus valores e direitos.

O magistrado, portanto, a quem,  em representação ao Estado-Juiz,  incumbe tal mister, deve ser alguém isento, imparcial por excelência. Altamente capacitado no aspecto técnico, detentor de um bom senso que lhe permita interpretar a lei de forma justa e impessoal,  precisa ainda ser retirado dentre os melhores do mundo jurídico, garantindo-se dessa forma a sociedade que suas querelas estarão sendo apreciadas com a devida e necessária qualidade. Abnegado e responsável, deve ainda manter comportamento público e privado inquestionáveis, sob pena de por em risco a dignidade de sua decisão,  ainda que juridicamente bem alicerçada, em face da austeridade cuja publicidade o o cargo impõe.

O Estado deve sim lhe garantir prerrogativas, inerentes ao cargo, capazes de lhe proporcionar  a tranquilidade necessária ao exercício de suas funções,  com o equilíbrio e a sensatez que o seu cliente, a sociedade, merece.  Uma remuneração compatível com o cargo e vantagens compensatórias capazes de retribuir a contento as privações decorrentes de sua função, – a exemplo da proibição do exercício de outras tarefas (ressalvado o magistério) e a constante exposição de sua segurança em face do desempenho de uma atividade,  onde sempre haverá um sucumbente insatisfeito, condenações criminais, etc..- são fundamentais e representam a única forma capaz de garantir a excelência de seus quadros, que, do contrário, tenderão a migrar para outros campos mais vantajosos, sem riscos a sua segurança, com menores exigências e responsabilidade inferior.

O objeto sob o qual recai o trabalho do magistrado é a liberdade humana, seu patrimônio, sua honra e até sua vida, de tal sorte que, envolvido com grandezas dessa ordem,  magistrados não conseguem se desincumbir de sua atividade nem mesmo nas horas de seu descanso. Plantonistas naturais de suas Comarcas e Varas,  diga-se de passagem sem compensação remuneratória e em algumas circunstâncias por até 24 horas,  magistrados trabalham em sua maioria, de forma efetiva, ultrapassando carga superior aquela constitucionalmente admissível,  sem contar com as horas que fica potencialmente a disposição de qualquer ocorrência, o que em qualquer outra carreira é tida por hora trabalhada com todos os direitos: horas extras, adicionais noturnos, enfim…, e que para os magistrados é apenas mais um obrigação decorrente da sua função de agente político, nas horas em que essa definição parece conveniente a todos,  inclusive ao CNJ.

A atual Conjuntura Nacional, a política de amesquinhamento do Governo Federal para com a Magistratura Nacional, a apatia da entidade de classe nacional da magistratura – A AMB, tudo isso aliado a total ausência de qualquer reação segura do STF,  que se mantém tímido em se fazer respeitar enquanto Poder autônomo e Independente desse País,  tem aviltado a profissão de juiz, fazendo com que magistrados estejam com absurda defasagem no poder de compra de sua remuneração,  direito básico de todo e qualquer trabalhador, amargando perda de 1/3 de seu poder de compra!

O resultado dessa orquestração, –  que só interessa aos setores mal intencionados –   é a perda de vários de seus membros para outras carreiras, senão em busca de melhores vantagens, ao menos na certeza de uma melhor qualidade de vida.  Nesse cenário,  magistrados fazem concursos para Cartórios Públicos ou mesmo Procuradorias, em regra com possibilidade do exercício paralelo da advocacia,  ou finalmente antecipam suas aposentadorias,  embora muito tivessem ainda a oferecer a sociedade com sua experiência e seu conhecimento técnico.

Sem olvidar aqui da importância de cada função exercida no âmbito do direito,  juizes são membros de uma dos Poderes do Estado, e, nesse papel,  não atuam contra ou a favor de uma tese, mas, simplesmente personificam o próprio Estado em sua função jurisdicional,  com a entrega da tutela pretendida pelos que se socorrem do Judiciário.  Outrossim,  é fato que a cada prerrogativa – que se exerce em nome da sociedade – o Estado pede em troca um compromisso e um sacrifício específico daquela condição, a ser suportado por cada membro da magistratura.

Diversos e constantes ataques têm sido deflagrados contra a magistratura, seja através de PEC  perniciosas a sociedade,  as quais visam retirar prerrogativas do cargo,  enfraquecendo o Judiciário,   submetendo-lhe  ao julgo do Legislativo e deixando a sociedade desprotegida;  seja através de ataques injustos de entidades outras que buscam na depreciação da magistratura e na exposição deletéria de seus valores o mote para suas conquistas, numa ilusão  de que é possível se fazer política de classe com a desvalorização e ataque a magistratura.

Em verdade, qualquer tentativa de aviltar a magistratura sergipana (ou nacional) implica em desserviço a uma população que a cada dia mais precisará desse porto seguro, porque crescente é a busca pela Justiça,  como crescente é o desrespeito pelo direito alheio, boa parte das vezes, senão na maioria delas,  tendo como algoz o próprio Estado.

A magistratura sergipana, em que pese reconhecida nacionalmente, fruto do trabalho de magistrados e servidores, através de sua associação, reconhece haver espaço para seu aprimoramento. Entende a necessidade de uma ampla reforma,  com as adequações necessárias.  Reconhece a necessidade do extermínio de algumas figuras antigas existentes nos três Poderes, como a incorporação de gratificações e acredita viável ainda uma redefinição de valores de cargos.  Mas, se é fato que a crítica precisa ser feita,  precisamos também apresentar os instrumentos de correção, pela via lícita e adequada, atuando com lealdade e buscando a governabilidade eterna de um Poder,  porém resguardando a sua imagem, em prol e em respeito da própria sociedade.
 

Gustavo Adolfo Plech Pereira
Presidente da Associação dos Magistrados de Sergipe (AMASE)